Tomo a liberdade de reproduzir o texto de minha amiga Maria Aparecida Torneros que me foi enviado por email:
O Duda Paes não nasceu no subúrbio, mas por seu trabalho administrativo, aprendeu a ficar mais perto da gente sangue bom, que torce no Maraca, que lota a arquibancada, e volta de trem pra casa.
Só quem tem origem suburbana sabe o que é pegar o trem e sentir como é ser povo na acepção da palavra.
Não basta enaltecer Ipanema, das suas águas paradisíacas ou da sua gente bonita que olha para o subúrbio com ar de lugar muito além do túnel...menina que passa, coisa mais linda, mais cheia de graça..é verdade, mas nos lados da linha suburbana da Central do Brasil ou da Leopoldina, só indo e vivendo, pra saber como o carioca pode se tornar o mais expontaneo churrasqueiro da esquina, de bermudão, sem camisa, muita cerva gelada no domingo que é pra curtir com a vizinhança, sem preconceito de cor, idade ou escolaridade.
Vai chegando e sentando, na beira da calçada ou no caixote improvisado, vai trazendo o seu alô, risada sem parcimônia, um lugar de gente simples e respeitosa, gente que sabe onde tem o nariz e onde mete o bedelho. Não dá pra torcer o nariz pensando se a carne é de gato, ou se tem gente sem dente, isso é coisa da zona sul camuflada, onde se vive de pompa, circunstância, eloquencia e ares de papai sabe tudo.
Na periferia suburbana, quem sabe das coisas é malandro e esconde o jogo. Só a ida e a volta ao trabalho, durante a semana, de trem , ônibus , van ou no transporte alternativo, ou no metrô da Pavuna, quem é realmente carioca sente e sabe o que é curtir um engarrafamento, um enguiço, um atraso e um calor de condução apinhada, enquanto se fala de tudo, desde futebol à política e se faz enredo de samba, pra cada carnaval que se aproxima.
A princesinha do Subúrbio, Madureira, dá o tom do adereço, do começo da prosa, da letra do samba, do termômetro de vendas no seu mercado, tradição de quem compra apetrechos pra festa, pra despacho ou pra fantasia.
Lugar de quem é procurado na hora do voto e esquecido na entre safra eleitoreira, o subúrbio carioca não é lugar de gente boba, isso é que não é mesmo...
Discurso concatenado, a gente entende, bate palmas, mas enredo enrolado, de quem nem sabe bem o que se passa pelas bandas distantes da luz e do glamour da orla marítima carioca, nem vem que não tem. Pega o trem, meu camarada, atravessa o túnel, aterrissa na Penha, na zona da mata que sobrevive com garra, onde falta sempre um pouco de tudo, menos a luta pela sobrevivência e o bom humor nas tardes dominicais.
Vinícius, com "gente humilde", definiu bem o que é o subúrbio carioca. Aí me dá como uma inveja dessa gente, que vai em frente, sem ter com quem contar...
Pois que se conte com alguém mas que seja alguém menos emproado, com menos nariz empinado, que seja gente como a gente, que não nos traga tanta frase feita, mas sim trabalho definido, coisa de quem põe a mão na massa, mete o pé no atoleiro, pisa no cocô na grama ou na calçada, enfrenta enchente, ajuda o "companheiro", extende a mão, enfrenta a madrugada na fila da matrícula da escola, ou vai junto pra porta do pronto socorro, esperar pelo atendimento, ao lado de um familiar ou amigo.
É gente assim que faz a diferença, sem modéstia, que pega na alça do caixão do presidente da escola, que se ajeita no seu pleiteado lugar ao sol, ainda que a luz lhe seja difusa ou os holofotes brilhem para as zonas mais ricas da cidade.
Nada disso importa se um sujeito fala a lingua do povo e o reconhece, ou melhor, se reconhece como gente também humilde, mas é preciso ter voz menos impostada, não se deixar levar pela onda, entender que o Rio é mais periferia que zona Sul, em número e força de trabalho.
Para prefeito do Rio, vou de Duda, homem com cara de trabalho, administrador com eficiência comprovada, e, quanto ao Gabeira, sei que ele é ícone da história, merece legislar, discursar e desfilar na orla, mas, ainda não aprendeu a pegar o trem pra Madureira.
Aparecida Torneros (nascida e criada em Ramos,moradora da Vila Isabel, carioca da zona Norte e suburbana de carteirinha)
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